quinta-feira, 21 de junho de 2012

Fichamento do texto: A sujeição da renda da terra ao capital e o novo sentido da luta pela reforma agrária


A sujeição da renda da terra ao capital e o novo sentido da luta pela reforma agrária
MARTINS, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. As lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. 5º ed. Petrópolis: vozes, 1995, p. 151 – 177.
O que são as relações capitalistas de produção
A tendência do capital é a de tomar conta progressivamente de todos os ramos e setores da produção, no campo e na cidade, na agricultura e na  indústria. (p. 152)
Quando falam expansão capitalismo no campo, as pessoas querem referir a duas coisas, pelos menos combinadas entre si: de um lado, uma massa crescente de camponeses, isto é, de lavradores autônomos cujas existências estão baseadas estritamente no seu trabalho e no de sua família, estaria sendo expulsa da terra, expropriada; de outro lado, em conseqüência, essa massa de lavradores estaria se transformando em massa de proletários rurais, de trabalhadores sem terra. (p. 152)
Entre desiguais não há possibilidade de contrato, há dominação. Por isso, no capitalismo, só é pessoa quem troca quem tem o que trocar e tem liberdade para fazê-lo.  (p. 153)
Nós sabemos que só o trabalho cria valor, criar riqueza, e que esse valor se mede pelo numero de horas de trabalho socialmente necessárias à produção da mercadoria. A função do trabalho é a de recriar o trabalhador, fazer com que o homem que trabalha reapareça como trabalhador do capital. Assim ele recria ao mesmo tempo a sua liberdade e a sua sujeição. (P. 154)
Na verdade isso é possível porque a desigualdade econômica entre o capitalismo e o trabalhador só pode ocorrer com base na igualdade jurídica sob a qual eles se defrontam. Para o trabalhador que só é proprietário da sua força de trabalho que só lhe serve para troca-lá por algo que lhe permita sobreviver, como é o caso do salário, concebido como equivalente daquilo que ele necessita. A troca que faz com o patrão, trabalha por salário, é uma troca aparentemente igual. O capitalista, porém, não seria capitalista, isto é, proprietário de capital, se o seu envolvimento nessa relação social de troca produzisse como resultado unicamente a riqueza que já possuía quando começou o seu relacionamento com o trabalhador. (p. 155)
O capitalismo é uma relação capitalista, está no fato de que essa relação é uma relação de exploração baseada numa ilusão. O trabalhador não se vê como é, mas como parece ser como igual e livre; não como o capital dependesse dele, do seu trabalho, mas como se ele dependesse do capital. (p. 156)
É isso que se quer dizer quando se fala em alienação do trabalhador na sociedade capitalista. Ele não aparece como criador da riqueza, do capital, mas como criatura desse mesmo capital. Não são as pessoas que relacionam entre si; são as coisas que o fazem, na troca. Por isso é que as relações entre as pessoas aparecem no capitalismo como se fossem relações entre coisas e as relações entre as coisas, as mercadorias, é que surgem como se fossem relações sociais entre as pessoas. (p. 157)
O dinheiro só é capital e o seu proprietário só é capitalista quando aquele é empregado na compra de instrumento e de matérias-primas por meio dos quais se poderá explorar o trabalho de trabalhador, compra a força do trabalho para promover a reprodução do capital. O capital é produto do trabalho não pago, da conversão em capital do trabalho que exerce aquele que se materializou em salário. (p. 158)
A contradição entre a terra e o capital: a renda da terra
A terra é um bem natural, finito, que não pode ser reproduzido, não pode ser criado pelo trabalho. A terra é um instrumento de trabalho qualitativamente diferente dos outros meios de produção. Quando alguém trabalha na terra, não é para produzir a terra, mas para produzir fruto da terra. (p. 159 e 160) Como o capital tudo transforma em mercadoria, também a terra passa por essa transformação , adquire preço, pode ser comprada e vendida, pode ser alugada. A licença para a exploração capitalista da terra depende, pois, de pagamento ao seu proprietário. (p. 160 e 161)
O pagamento da renda da terra representa, pois, uma irracionalidade para o capital. A apropriação capitalista da terra permite justamente que o trabalho que nela se dá, o trabalho agrícola, se torna subordinado ao capital. A terra assim apropriada opera como se fosse capital, ela se torna equivalente de capital. De fato, o que ela produz, do ponto de vista capitalista, é diferente do que se produz o capital. Lucro, isto é, a parcela da mais valia, de riqueza a mais, que o capitalista retém. (p. 162) Por isso, a renda capitalista da terra não nasce na produção, mas sim na distribuição da mais valia. (p. 163)
Creio que, com o que foi dito, podemos entender que a mais valia não é paga por ninguém em particular porque ela é paga pelo conjunto da sociedade. (p. 164)
As diferenças entre a concentração da propriedade e a do capital
Vimos que as contradições entre terra e capital cria as condições histórica da existência de duas classes antagônicas: os proprietários da terra e os capitalistas. Ambos são proprietários privados de instrumento de produção, separados dos trabalhadores que podem movimentá-lo, fazê-lo produzir. (p. 165)
Com o passar do tempo, com o trabalho, a terra não se desgasta, ela melhora, ela enriquece o proprietário. O capitalismo subtrai capital do processo social de produção, imobiliza o seu capital, prende-o a terra. Terá que arrumar outros capitais para a terra possa produzir. Se não se depuser, meramente se convertendo de capitalista em proprietário de terra. (p. 167)
O que temos aí é o capitalista revelando a sua face ocultada pela condição de proprietário. (p. 168) É uma relação social no sentido que tem a relação social no capitalismo, como expressão de um processo que envolve trocas, mediações, contradições, articulações, conflitos, movimento, transformações. (p. 169)
Não posso entendê-la se não vejo que a terra, através do proprietário, cobra no capitalismo renda da sociedade inteira, renda que nem mesmo é produzida direta e exclusivamente na sua terra. É uma parte do trabalho expropriado de todos os trabalhadores dessa mesma sociedade. (p. 169)
O proprietário da terra não é uma figura de fora do capitalismo, mas de dentro. (p. 170)
Só a reprodução é capitalista. Mesmo o crescimento deste capital não é produção, mas reprodução capitalista ampliada. (p. 171)
A apropriação da renda da terra pelo capital
A contradição fundamental é que a produção da riqueza é socializada pelo capital, é social, e a sua apropriação é privada: o burguês e o proprietário da terra se apropriam dessa riqueza. A contradição entre ambos não é uma contradição da terra, é uma contradição do capitalismo. (p. 172)
O trabalhador se transforma  num trabalhador coletivo; cada individuo é parte desse trabalhador coletivo. Nesse caso, trabalho deixa de estar formalmente subjugado pelo capital e passa a estar realmente subjugado. (p. 174)
O que essa relação nos indica é outra coisa, bem distinta: estamos diante da sujeição da renda da terra ao capital. O capital tem se apropriado diretamente de grandes propriedades ou promovido a sua formação em setores econômicos do campo em que a renda da terra é alta, como no caso da cana, da soja e da pecuária de corte. Onde a renda é baixa, como no caso dos setores de alimentos de consumo interno generalizado, o capital não se torna proprietário da terra, mas cria as condições para extrair o excedente econômico. (p. 175)
Onde o capital não pode tornar-se proprietário real da terra para extrair juntos o lucro e a renda, ele se assegura o direito de extrair a renda. (p. 176)

LUCIANO ULATOSKI




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